Como Criar Jogos de Comunicação Não Verbal em Casa

A comunicação não verbal é a linguagem que falamos sem usar palavras – através de gestos, expressões faciais, contato visual e postura corporal. Para muitas crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), decifrar e usar essa linguagem sutil pode ser um grande desafio, levando a dificuldades nas interações sociais e na expressão de suas próprias necessidades e sentimentos. No entanto, o ambiente familiar oferece um espaço seguro e flexível para praticar essas habilidades de forma divertida e descontraída.

Este artigo é um guia prático para criar jogos de comunicação não verbal em casa, utilizando materiais simples e acessíveis. Exploraremos como transformar atividades diárias em oportunidades de aprendizado, focando em estratégias que engajam a criança com autismo e facilitam o desenvolvimento de suas habilidades sociais e expressivas. Nosso objetivo é capacitar pais e cuidadores a fomentar uma comunicação mais rica e eficaz no dia a dia do lar.


Por Que Jogos de Comunicação Não Verbal em Casa?

O ambiente doméstico é ideal para o desenvolvimento da comunicação não verbal porque:

  • Segurança e Baixa Pressão: A criança se sente mais à vontade para experimentar e errar sem a pressão de um ambiente externo.
  • Contexto Natural: As habilidades são praticadas em situações e com pessoas que fazem parte do cotidiano da criança, facilitando a generalização.
  • Flexibilidade e Personalização: Os jogos podem ser adaptados instantaneamente às necessidades, interesses e nível de energia da criança.
  • Oportunidades Constantes: Quase toda interação ou atividade diária pode ser transformada em um pequeno jogo de comunicação não verbal.
  • Fortalece Vínculos: Engajar-se em brincadeiras divertidas e focadas em comunicação fortalece o vínculo entre a criança e o cuidador.

Habilidades de Comunicação Não Verbal para Focar

Ao criar jogos, considere quais habilidades específicas você deseja estimular:

  • Contato Visual: Olhar nos olhos do parceiro de comunicação ou para o objeto/pessoa que está sendo discutido.
  • Expressões Faciais: Reconhecer e produzir diferentes expressões para emoções (feliz, triste, bravo, surpreso, com medo).
  • Gestos: Usar as mãos e o corpo para apontar, acenar, pedir “mais”, “vir”, “parar”, etc.
  • Postura Corporal: Entender como a posição do corpo pode comunicar interesse, cansaço, raiva ou relaxamento.
  • Atenção Conjunta: Compartilhar o foco visual em um objeto ou evento com outra pessoa, alternando o olhar entre o objeto e o rosto do interlocutor.
  • Tomada de Turnos: Compreender e seguir a sequência de “minha vez, sua vez” em uma interação.

Ideias de Jogos de Comunicação Não Verbal para Fazer em Casa

Aqui estão algumas ideias de jogos simples e eficazes que você pode criar e adaptar em casa, com materiais comuns.

1. Jogo do “Espelho das Emoções” 🎭

  • Materiais: Um espelho (de mão ou de parede), cartões com fotos ou desenhos de expressões faciais.
  • Como Fazer:
    • O adulto mostra um cartão de emoção (ex: rosto feliz).
    • Pede para a criança imitar a expressão no espelho.
    • Nomeie a emoção enquanto a criança imita: “Você está fazendo um rosto feliz!”
    • Variação: O adulto faz uma expressão facial e a criança tenta adivinhar a emoção, ou aponta para o cartão correspondente.
  • Habilidades Estimuladas: Reconhecimento e produção de expressões faciais, contato visual (ao olhar para o adulto e para si mesmo no espelho).
  • Dica: Comece com emoções básicas e fáceis de identificar. Faça caretas engraçadas para tornar a atividade divertida e menos pressionante.

2. “Adivinhe o Gesto” (Mímica Simples)

  • Materiais: Nenhum material específico (ou um chapéu para tirar “ideias de gestos”).
  • Como Fazer:
    • O adulto pensa em uma ação comum que pode ser expressa com gestos (ex: dormir, comer, beber, pular, acenar, “ligue para mim”).
    • O adulto faz a mímica da ação sem falar.
    • A criança tenta adivinhar qual é a ação.
    • Depois, a criança pode fazer a mímica para o adulto adivinhar.
  • Habilidades Estimuladas: Compreensão e produção de gestos, tomada de perspectiva (“o que o outro está tentando me dizer?”), atenção conjunta (focar nos movimentos do corpo do outro).
  • Dica: Comece com mímicas muito óbvias e familiares para a criança. Use pistas visuais ou uma imagem para a criança escolher a mímica que ela quer fazer.

3. “Onde Está o Meu Olhar?” (Atenção Conjunta com Objetos) 👀

  • Materiais: Vários brinquedos ou objetos interessantes espalhados pela sala.
  • Como Fazer:
    • O adulto pega um objeto e o segura para que a criança possa vê-lo.
    • Em seguida, o adulto olha para o objeto e depois para os olhos da criança, e depois de volta para o objeto, repetindo “Olhe! O ____!”
    • Incentive a criança a seguir o olhar do adulto para o objeto, e depois a olhar para o adulto.
    • Variação: O adulto olha para um objeto sem pegá-lo, e a criança tenta adivinhar para onde o adulto está olhando.
  • Habilidades Estimuladas: Atenção conjunta, contato visual, seguimento de olhar.
  • Dica: Use objetos que sejam altamente motivadores para a criança. Comece com objetos muito próximos e aumente a distância gradualmente.

4. “Siga o Líder dos Movimentos” (Corpo e Postura) 🚶‍♀️

  • Materiais: Nenhum material específico, ou um pouco de música para tornar mais dinâmico.
  • Como Fazer:
    • O adulto é o “líder” e faz um movimento corporal ou assume uma postura (ex: cruzar os braços, colocar as mãos na cintura, sentar no chão, deitar, ficar em pé, pular, abaixar).
    • A criança é o “seguidor” e imita o movimento ou a postura.
    • Troquem de papéis.
  • Habilidades Estimuladas: Imitação motora, consciência corporal (propriocepção), compreensão de posturas.
  • Dica: Comece com movimentos amplos e claros. Adicione emoção aos movimentos: “Ande como se estivesse triste”, “Pule como se estivesse muito feliz!”.

5. “Histórias sem Palavras” (Comunicação de Narrativas) 📖

  • Materiais: Cartas de “Story Cubes” (dados com imagens) ou simplesmente algumas fotos ou ilustrações aleatórias.
  • Como Fazer:
    • Escolha 2 ou 3 cartas/fotos que representem elementos de uma história (ex: um animal, um objeto, um lugar).
    • O adulto começa a contar uma história usando apenas gestos e expressões faciais para descrever o que está acontecendo.
    • Pede para a criança continuar a história, também usando apenas gestos e expressões.
  • Habilidades Estimuladas: Expressão de narrativa não verbal, criatividade, tomada de perspectiva (o que o personagem está sentindo ou fazendo?).
  • Dica: Use imagens que interessem muito à criança. O adulto pode verbalizar a história depois que a criança tentar contá-la com o corpo, para validar a tentativa e fornecer o vocabulário.

6. “O Apontar Mágico” (Comunicação de Desejos) ✨

  • Materiais: Brinquedos ou lanches preferidos da criança.
  • Como Fazer:
    • Coloque dois itens desejados na frente da criança.
    • O adulto pergunta: “O que você quer?” e modela o apontar para um dos itens e depois para o adulto, alternando o olhar.
    • Ajude a criança a apontar para o item desejado. Quando ela apontar, dê o item imediatamente e verbalize o nome.
  • Habilidades Estimuladas: Apontar (gesto proto-declarativo e proto-imperativo), contato visual, atenção conjunta.
  • Dica: Comece com dois itens bem diferentes e muito desejados. Gradualmente, peça que a criança olhe para você (o interlocutor) e para o item.

Dicas Essenciais para o Sucesso ao Criar Jogos em Casa

  • Seja o Modelo: As crianças aprendem pela imitação. Mostre a linguagem corporal que você quer que ela aprenda. Exagere um pouco suas expressões e gestos.
  • Contexto e Conexão: Conecte os jogos à vida real. “Lembra como o fantoche ficou bravo? Como você mostra que está bravo?”
  • Observe os Interesses da Criança: Adapte os jogos aos temas, personagens ou atividades que a criança adora. Isso aumenta o engajamento.
  • Paciência e Reforço Positivo: O desenvolvimento da comunicação não verbal é um processo. Celebre cada tentativa e cada pequeno sucesso com muitos elogios e incentivos.
  • Sessões Curtas e Divertidas: Mantenha os jogos leves e curtos para evitar a fadiga e a frustração. O objetivo é diversão e aprendizado, não perfeição.
  • Use Apoios Visuais: Se a criança se beneficia de apoios visuais, use cartões, emojis ou diagramas para ajudar a representar as emoções ou os gestos.
  • Ambiente Calmo: Reduza distrações durante o jogo. Um espaço tranquilo ajuda a criança a focar na interação.
  • Flexibilidade: Esteja pronto para adaptar o jogo ou mudar de atividade se a criança não estiver engajada ou parecer sobrecarregada.

Conclusão: O Diálogo Silencioso que Conecta

Criar jogos de comunicação não verbal em casa é uma forma poderosa e amorosa de apoiar o desenvolvimento de crianças com Transtorno do Espectro Autista. Ao transformar o cotidiano em oportunidades lúdicas para praticar gestos, expressões e contato visual, você estará construindo pontes para uma comunicação mais rica e para uma conexão mais profunda.

Lembre-se de que cada sorriso, cada apontar e cada olhar compartilhado é um passo significativo em direção a uma maior compreensão e autoexpressão. Permita que o diálogo silencioso floresça em seu lar, enriquecendo a vida da criança e fortalecendo os laços familiares.

Qual desses jogos você está animado para experimentar primeiro? Você tem alguma outra ideia de jogo de comunicação não verbal que funciona bem em casa? Compartilhe suas experiências!

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